Resenha: Estilhaça-me - Tahereh Mafi


Juliette não toca alguém a exatamente 264 dias. A última vez que ela o fez, que foi por acidente, foi presa por assassinato. Ninguém sabe por que o toque de Juliette é fatal. Enquanto ela não fere ninguém, ninguém realmente se importa. O mundo está ocupado demais se desmoronando para se importar com uma menina de 17 anos de idade. Doenças estão acabando com a população, a comida é difícil de encontrar, os pássaros não voam mais, e as nuvens são da cor errada. O Restabelecimento disse que seu caminho era a única maneira de consertar as coisas, então eles jogaram Juliette em uma célula. Agora muitas pessoas estão mortas, os sobreviventes estão sussurrando guerra – e o Restabelecimento mudou sua mente. Talvez Juliette é mais do que uma alma torturada de pelúcia em um corpo venenoso. Talvez ela seja exatamente o que precisamos agora. Juliette tem que fazer uma escolha: ser uma arma. Ou ser um guerreiro.

Título do livro: Estilhaça-me
Título original: Shatter me
Autor(a): Tahereh Mafi
Tradução: Robson Falchetti Peixoto
Editora: Novo Conceito
Ano: 2012
Páginas: 304



Twists que prenderão sua atenção


     É fato que estamos passando por uma fase literária onde as distopias são exploradas à exaustão. Porém, sendo um conceito muito amplo, ainda há bastante material para os escritores trabalharem. Pelo menos, se desistirem de ficar na sombra da fórmula consagrada pela trilogia Jogos Vorazes. Felizmente, Tahereh Mafi ousou criar algo diferente, nos trazendo uma história que critica a sociedade entre linhas da mais bela narração, regada a histórias de amores, traições, poder e medo.


Enredo

    O planeta Terra é um lugar caótico. Os seres humanos destruíram praticamente todos os recursos naturais e agora são comandados por um grupo chamado Restabelecimento. Esse grupo prometera ajudá-los, prometera salvá-los. E embora os seres humanos não tenham sido extintos da face da Terra, a situação é pior do que nunca. Esperança é uma palavra difícil de se entender. Especialmente para Juliette Ferrars, que está em uma cela solitária de um instituto mental há quase um ano. Seus únicos amigos são números e palavras. Ela está sozinha, e começa a acreditar que ficará realmente louca. Até que, de repente, um prisioneiro é enviado para sua cela. Um lindo prisioneiro chamado Adam Kent, garoto com quem Juliette estudou, anos atrás. E, é claro, é aí que os problemas começam.

          Após descobrir que Adam é, na verdade, um soldado do Restabelecimento, Juliette é tirada da instituição e levada para o complexo onde moram Warner, o líder do setor 45, e seus soldados. Lá, ela descobre que os planos do Restabelecimento não tem nada a ver com matá-la, exterminando uma ameaça, mas sim usar seu toque fatal como uma arma. 

          A última coisa que Juliette quer é sucumbir à sua maldição  jamais quis machucar outra pessoa. Afinal, foi o seu toque fatal o que acabou com suas chances de ser normal, ter pais que a abraçassem e protegessem, amigos, um namorado... Porém, Warner não parece capaz de entendê-la, crendo que após tudo o que ela passou – a rejeição, a dor, a humilhação –, ela deva ter uma profunda sede de vingança; sede da qual ele pretende se aproveitar.

          Encontrando pela primeira vez alguém em quem pode tocar sem machucar, Juliette começa a viver uma paixão que a faz perceber que suas escolhas são tornar-se uma arma ou tornar-se livre. Contudo, nenhuma das escolhas será fácil.


Narrativa

          Narrado por Juliette, o livro possui uma narrativa bastante peculiar. Não ficamos apenas vendo pelos olhos da protagonista, nós realmente entramos em sua cabeça. Todos os pensamentos contraditórios, aqueles pensamentos que martelam em nossas mentes mesmo quando tentamos reprimi-los, cada dúvida, cada sensação. É verdade que às vezes o tom poético exagera e parece forçado em determinadas situações. Mas, mesmo assim, acredito que neste quesito a autora é genial. Assim como Mark Zusak.

          Os capítulos não são curtos nem longos, mas o ritmo da narrativa por vezes se arrasta um pouco, com cenas semelhantes ou que não parecem levar à lugar algum. Por sorte, antes que esses momentos tornem a leitura monótona, algo acontece e força os personagens a seguirem por outro rumo, atraindo o leitor novamente para dentro da história, envolto e ansioso por saber o que acontecerá a seguir.

          Outra coisa interessante de se notar é que, conforme Juliette se distancia da instituição mental e começa a confiar em si mesma, deixando de acreditar de uma vez por todas que possa ser louca, também diminui a quantidade de pensamentos contraditórios que ela tem (representados tão bem no começo pelas linhas riscadas).


Personagens

          Juliette é uma personagem complicada, não apenas em seu passado. Apesar de todo o sofrimento, às vezes sua bondade chega a ser incrivelmente inocente e irreal. Ainda assim, sua narração traz uma profundidade incontestável ao personagem, tornando-a uma das melhores narradoras-personagens que já conheci.

          Warner, por sua vez, exala um mistério confuso desperta curiosidade. Coisas como as razões que o tornam frio e calculista, ou o interesse obsessivo por Juliette, não são explicados tão claramente. Pelo menos, não ao ponto de que Juliette seja capaz de ver e nos mostrar através de seus pensamentos. 

          Adam, porém, é o menos desenvolvido. Pois apesar de ter bastante contato com Juliette e um passado que poderia ser mais explorado, ainda o personagem é pouco trabalhado e muito idealizado. Contudo, se tratando de uma trilogia, ainda espero que ele ganhe espaço para se desenvolver nas continuações.


Temática/mitologia

          Toda a parte distópica é bem explicada. Durante o decorrer da história, Juliette se lembra de pedaços do passado que nos ajudam a ter o panorama de como era o mundo e o que aconteceu para que ele ficasse como está. Foi inteligente da parte da autora não colocar toda a parte explicativa ao mesmo tempo, para assim não sobrecarregar o leitor com informações que, de certa forma, não são o centro da história.

               Já sobre o toque fatal que a protagonista possui, não parece haver uma explicação, ela apenas nasceu assim e pronto. Porém, em um twist ela descobre que tudo o que acreditava sobre sua maldição/dom/habilidade estava errado. Descobre também que ela não é a única de sua "espécie" e, certamente, não precisará viver temendo, nem se transformar em uma arma de destruição tampouco.


Romance

           Se você gosta de amores à primeira vista, este livro é para você. O lado romântico da história é bastante idealizado. Até certo ponto, não chamaria de clichê ou forçado, porque Juliette tem seus motivos para agir e se sentir assim, afinal, ela nunca pode tocar outro ser humano sem causar dor e/ou morte – como já foi citado, nem seus próprios pais se arriscavam a chegar perto dela. Adam, por outro lado, simplesmente se apaixona à primeira vista e passa a amá-la mais a cada página. Ele tem um passado conturbado e se identifica com ela? Sim, mas não acho essa razão suficiente; é muito amor para pouco tempo de convivência. Ele não gosta ou se apaixona, ele ama. Fica faltando algum conflito, alguma dificuldade, alguma coisa. Inclusive, muitas vezes o leitor poderá ficar com um pé atrás a respeito de Adam, justamente porque tanta perfeição costuma causar desconfiança. 

Edição

           A capa é bonita, mas não traduz bem a história. A modelo na capa não está com uma expressão definida, apenas parece posar para um catálogo, o que desvaloriza um pouco a ideia principal do livro. As novas capas (lançadas nos EUA) são mais bonitas e representam a história de forma muito melhor. Por sorte, o último título já será lançado assim [imagem], e quem sabe a editora não relance os outros dois no mesmo padrão? 

           Na parte interna, a edição é caprichada. A numeração e detalhes de início dos capítulos seguem o padrão do título da capa, com o efeito de corte. Porém, fiquei chateada que não colocaram na edição brasileira o trecho do poema de Robert Frost [leia], que aparece na edição americana, antes do início da história. Na verdade, também senti falta da dedicatória, que tampouco aparece na edição nacional.

           Já quanto a tradução/revisão, há alguns erros, mas apenas um me fez torcer o nariz de verdade. Em geral, são apenas palavras que têm dois sentidos, mas o tradutor acabou escolhendo o uso errado de acordo com o contexto. E a revisão também deixou não percebeu! De qualquer forma, não foi tanta coisa (algo por volta de cinco errinhos), e nada que realmente prejudicasse o entendimento da história, portanto, dá para relevar.


Avaliação

             Se você não aguentou ler essa resenha por causa dos trechos riscados, nem adianta se aventurar a ler o livro, porque é exatamente esse o estilo que a autora adota em sua narrativa. Ainda assim, recomendo a leitura, porque é uma história sobre superação de medos, autoconhecimento e o poder das escolhas. Além disso, as críticas sociais são maravilhosamente veladas entre trechos metafóricos e quase poéticos, que com certeza entrarão na mente do leitor e causarão pelo menos o mínimo de reflexão.



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